Não continuar...
O início é sempre entusiasmado, saltando entre o fascínio e a embriaguez. Tentamos chegar ao outro: "ninguém tem necessidade de falar do amor se não é para alguém". O começo pode nascer de um impulso, de alguma irracionalidade. O começo é inocente, despreocupado e descomprometido. Não vemos implicações. É sempre apaixonante.
O começo de todos os projectos também é assim: temos muitas ideias aliciantes, imaginamos projectos mirabolantes que implicam concretizações ultra sofisticadas. Idealizamos, somos capazes de tudo– imprimir a nove cores (onde o dourado seria ouro verdadeiro!)
Acabar também é simples. Mesmo em situações mais dolorosas, é sempre uma página que se vira, um recomeço. Fica decidido. Passa para trás, para as páginas da nossa memória. O fim pode ser a solução recorrente quando todas as nossas expectativas (derivadas da excitação inicial) falham e não se concretizam tal e qual as tínhamos pensado inicialmente. Acaba-se, também, quando não há mais nada a fazer, quando não temos mais nada a acrescentar. É um fim óbvio e que já esperavamos.
Muitas vezes me perguntaram como tive coragem para começar este diário (logo tu?!). Eu respondia que começar é sempre muito simples, até ao momento em que se começam a pôr em causa algumas coisas, e começam a aparecer situações que nos abalam. Nessa altura temos dois caminhos: acabar, que é a solução mais fácil (o que começa rapidamente pode terminar); ou continuar...
O começo, acelerado e descontrolado, logo se aloja no quotidiano e na banalidade do dia a dia. Por isso manter este diário (o desejo de um projecto) é mais difícil. É também mais trabalhoso, implica uma ambição. A continuidade integra-se na rotina, mas precisa sempre do tal elemento provocador, do inesperado, de muita dedicação e vontade. Continuar não é uma atitude passiva, implica a superação constante. É sempre difícil. O importante é encontrarmos prazer (Amor) nesta rotina. É um gozo instantâneo, à flor da pele, que se alimenta a si mesmo (com imprevistos, derrotas, conquistas, altos e baixos).
Por tudo isto, é sempre importante sermos honestos. Connosco e com os outros. Da honestidade faz parte aceitarmos aquilo que somos e não querermos ser outra coisa. Não arranjar artifícios, não enganar. Porque nunca imaginei um dia escrever este diário, expondo-me desta forma. Acabei por o ir fazendo aos bocadinhos...
Porque há coisas que não são para se perceberem, e esta é uma delas. Esta história não tem continuidade.